ACESSIBILIDADE PARA QUÊ?

LELEI TEIXEIRA

Jornalista

Se as pessoas pensassem nas crianças nem precisariam pensar em nós, os anões. Por que os trincos das portas precisam ser tão altos? As maçanetas redondas são uma maldade com os anões e com as crianças: para abrir é preciso ter uma mão grande. Ninguém se dá conta disso? A fala do anão Umberto no livro A história mais triste do mundo, do psicanalista Mário Corso, me levou a pensar, mais uma vez, no quanto dependemos do olhar e da atitude do outro e no quanto incluir não se resolve apenas com leis.
Se estivesse em um hospital, o anão Umberto perguntaria: Por que usar aparelho de pressão grande em braço tão curto? Detalhe que poucos lembram e que deixa evidente a negação da diferença. O tamanho, o peso, a dosagem da medicação, o conforto, o que fazer com um adulto em um corpo tão pequeno? As perguntas espantam e quase não temos respostas! Às vezes, o vácuo é tão insondável, que parecemos estrangeiros buscando um mínimo de dignidade em um mundo que insiste em não nos reconhecer.
Ouse, então, pedir um banco para alcançar na pia do banheiro de um hotel! Não importa quantas estrelas, o espanto é de quem ouve alguém pedindo uma cadeira com design dos irmãos Campana e a resposta é: Não temos! Até aparecerem com uma caixa de maçã ou um engradado de bebidas. Ou, ainda, com uma cadeira de dois braços, que ocupa todo o banheiro.
Já escrevi muito sobre acessibilidade e reafirmo: leis são necessárias. Regulam, dão garantias. A sociedade está preocupada, mas algumas medidas só dependem de atitude. Empresas e instituições, públicas ou privadas, sem entender o cotidiano de quem tem uma deficiência, preocupam-se apenas em cumprir ordens, perdendo a maravilhosa capacidade de improvisar e educar! Acessibilidade para que, mesmo?
Enquanto a burocracia discute como incluir, a vida anda e vamos encarando o cotidiano desse mundo “normal”. Um mundo tão normal e acomodado, que não vê na diversidade uma maneira de sair dos espaços institucionalizados e inventar, reinventar, criar, mudar, facilitar. A diferença, seja ela qual for, necessita de olhares sensíveis, capazes de ver o invisível, acolher e ousar.

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