Para além do preconceito que limita o olhar

ISSO NÃO É COMUM (Blog da LELEI)

Um turbilhão de ideias e desejos me move, muitas vezes impulsionado por um incontrolável sentimento de urgência. A cada dia é um projeto e um tropeço, uma certeza e uma contradição, um redemoinho e um controle, um fascínio e um desvario, uma fantasia e uma desilusão, um sonho e uma desesperança. No pano de fundo, a consciência da diferença e dos deslocamentos que a diferença provoca, no sentido de evitar a acomodação diante dos discursos prontos e engendrados socialmente.

Discursos sustentados pela necessidade de controle e perfeição, que reservam determinados lugares e papéis aos que não se enquadram aos modelos e à ordem estabelecida. Lugares e papéis que sempre rejeitei.

Vou me deslocando daqui e dali. Desafino. Harmonizo. Descompasso. Equilibro. E sigo, encarando a violência, o medo e a insegurança provocados pela intolerância que invade nossas vidas. São tantos os movimentos que, por momentos, me vejo em lugar nenhum. Que lugar é esse que busco? Qual o lugar das pessoas que não se conformam à vida como ela se apresenta porque têm uma diferença ou fazem escolhas que fogem da ordem? Já não busco o perdido. Ele faz parte da falta que é inerente aos humanos. O que busco é o lugar do diálogo, da tolerância, do olho no olho, da transparência, onde seja possível simplesmente ser.

Desde a minha primeira escrita no blog, em 5 de abril de 2016, tomo contato com muitas pessoas que não se enquadram e buscam espaços de fala através de ações pela diversidade, inclusão, acessibilidade, direito de ser. Estou descobrindo muita gente que mostra, com naturalidade, que é possível viver a diferença, respeitando o outro, criando, sem negar a deficiência e as dificuldades cotidianas.

Bem vindos à necessária e urgente boa luta, nos grupos, na web, no teatro, nas famílias, entre amigos, em todos os meios. É estimulante essa rede que faz a vida pulsar para além da mediocridade e do preconceito que limitam o olhar e transformam o horizonte em pontos sem luz.

Algumas pitadas sobre o Grupo Inclusivass, a websérie “Fale com Veca” e o espetáculo teatral “Paradinha Cerebral”.

Inclusivass – porque todas são todas

O Grupo Inclusivass, de Porto Alegre/RS, é formado por mulheres com deficiência e desde 2014 faz um trabalho incessante contra a violência, pela ampliação da consciência e do conhecimento dos direitos, pela inserção no mercado de trabalho, por políticas públicas que promovam a acessibilidade, buscando reduzir as barreiras para uma efetiva inclusão. Com o apoio da ONG Coletivo Feminino Plural, participa e apoia movimentos pela autonomia das mulheres, realiza oficinas, debates e palestras. Todas estão sempre atentas ao que acontece nesse inquietante universo feminino de lutas cotidianas. No blog www.inclusivass.blogspot.com.br, acesse o projeto TODAS SÃO TODAS, de inclusão das mulheres com deficiência nas políticas de enfrentamento à violência doméstica e demais políticas, que tem apoio do Fundo Fale Sem Medo (Instituto Avon e Fundo ELAS).
Agora em agosto, quando se completam 10 anos da Lei Maria da Penha, as Inclusivass participam da campanha do Fundo Fale sem Medo: “Eu falo sem medo, e você?”. As mulheres com deficiência fazem um vídeo de, no máximo, um minuto, respondendo à pergunta: “O que é violência para mulheres com deficiência?” Depois, publicam nas suas páginas no Facebook e na página do Grupo Inclusivass junto com a hashtag #inclusivassfalamsemmedo.

Fale com Veca – websérie no Youtube

Verônica Ned, imagem da websérie “Fale com Veca”

A atriz, cantora e publicitária Verônica Ned criou um canal no Youtube para falar de nanismo e outros assuntos que envolvem ser diferente em uma sociedade que se acha “normal”. A websérie “Fale com Veca” já está no ar, tem financiamento coletivo e foi produzida em parceria com a plataforma Benfeitoria. O objetivo do projeto, inspirado no filme “Fale com Ela”, de Pedro Almodóvar, é quebrar alguns tabus referentes ao nanismo, com bom humor e verdade.

Em 15 episódios, Verônica fala sem medo dos traumas da família, do preconceito, das dificuldades, enfrentamentos e sonhos, como o de fazer um filme com o cineasta espanhol. Filha caçula do cantor Nelson Ned (1947-2014), a atriz é anã como ele e os outros dois irmãos e já recusou papéis que faziam chacota de sua altura. Os episódios vão ao ar sempre às quartas-feiras, a partir das 11h. E na animação dos episódios tem um cara que conheço, o querido Nicolás Monasterio. Vale muito conferir o que Veca diz com transparência e leveza –https://www.facebook.com/falecomveca/.

Paradinha Cerebral – espetáculo teatral

Cacá Fernandez, ator do espetáculo “Paradinha Cerebral”

O protagonista da peça é o ator e cantor Cacá Fernandez, que tem paralisia cerebral e aborda com naturalidade seus enfrentamentos cotidianos. A proposta é mostrar a espontaneidade e inteligência de alguém que transforma a sua dificuldade em um mero detalhe ao dar uma entrevista no “Show da Madá”. Tudo começa quando os produtores do programa resolvem levar um convidado diferente para impulsionar a audiência: um jovem jornalista, cantor lírico, com paralisia cerebral, em cadeira de rodas. Com um humor peculiar e livre de neuroses, ele dá lições ácidas e divertidas à apresentadora, que se vê obrigada a encarar o sonho frustrado de ser cantora.

Em cena, os atores falam abertamente de preconceito, trabalho, sexo, inclusão e relacionamento. Para a produtora Lara Pozzobon, que tem uma bela trajetória nessas questões, “é importante para que as pessoas da plateia percam o preconceito”. Segundo ela, “Paradinha Cerebral” é um espetáculo em que a arte transcende a condição de cada indivíduo. No elenco, Cacá Fernandez (ator e cantor) e Mirna Rubim (atriz e cantora). Texto e direção de Iuri Saraiva. A videografia que permeia a peça é realizada por Daniel Gonçalves, jornalista, diretor de documentários, editor de programas de TV, que, como Cacá, tem paralisia cerebral. O espetáculo está em cartaz no Rio de Janeiro até 29 de setembro. Saiba mais no face: https://www.facebook.com/paradinhacerebral/.

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