Como é difícil ser diferente! Fragmentos
Pelo direito à diferença, por Tamar Matsafi
* “Quero a diferença, o encanto, o inusitado. A diversidade está em pauta, em todos os sentidos. Me incomoda o discurso de vítima que, às vezes, circula. O mundo culposo e ascético é ruim” – Fernanda Torres, atriz (Fevereiro de 2016).
* Ser diferente é correr perigo – reflexão da cantora Fernanda Takai sobre a diferença. A partir de gravação de videoclipe, em madrugada na capital paulista, cantando uma canção que dizia: “a gente se acostuma com tudo”. Com maquiagem e figurino que remetiam ao personagem Edward Mãos de Tesoura, versão moderna e mais sentimental de Frankenstein, ela estava irreconhecível. A publicação é de 18 de dezembro de 2015.
“Comecei a caminhar lentamente, enquanto as cenas eram captadas. A cada minuto alguém passava de carro ou a pé e gritava alguma coisa como: “olha a loucona!”, “bicha”, “sai, macumba!”, “que ser é esse, meu pai?”, sempre em tom de escárnio ou reprovação. Detalhe: quando percebiam que era uma gravação, trocavam um pouco a postura ofensiva por um “quem é?”, “é da televisão?”. Continuamos a andar, cruzamos a Avenida Paulista e uns fãs passantes me descobriram por trás daquela personagem.
Enquanto ia cantando e descendo a rua em direção à parte mais barra-pesada do lugar, ficava pensando como é difícil ser diferente nesse mundo. Seja pela roupa, o corpo, algum tipo de comportamento menos usual e nem por isso errado. Ser diferente é atrair olhares e pensamentos que a gente sente como espinhos. Mas o pior eu ainda ia sentir de verdade naquela madrugada.
O diretor queria gravar umas cenas num clube noturno que costuma lotar todas as noites. Logo chegamos ao lugar, que fica exatamente na área mais recheada de saunas, casas de espetáculos eróticos e hotéis de alta rotatividade. Ou seja, supus que haveria umas tantas pessoas também diferentes e que ali eu não chamaria atenção. Errado. Os mesmos comentários surgiram como farpas. Eu também não era daquela turma.
Conseguimos autorização pra entrar com a câmera na boate. Já no corredor de acesso, pressentindo a hostilidade, disse que era melhor a gente ir embora que as pessoas estavam me olhando feio demais. Me davam empurrõezinhos e se viravam resmungando qualquer coisa. O som era altíssimo e a iluminação precária. Quando começamos a gravar umas cenas em que eu apenas ficava na pista enquanto todos dançavam. Alguém deliberadamente agarrou meus cabelos e me puxou com força. Estava escuro, lotado, e as pessoas pareciam todas iguais. Digo, vestiam-se do mesmo modo. Não consegui ter certeza de quem foi. Justamente nessa hora a câmera foi desligada para ser ajustada à quantidade de luz e ninguém da pequena equipe que estava lá comigo conseguiu ver o ataque.
Imediatamente pedi pra irmos embora porque agressão física é o tipo de coisa que me faz perder a graça. Ou a gente parte pra cima ou foge. Eu fugi e fiquei com muita vontade de chorar. Nem tanto pela dor, mas pela constatação de que ser diferente é correr perigo. Não ser de uma determinada turma nos torna automaticamente alvos de um bocado de gente bruta e disposta a nos colocar no devido lugar pelas palavras e pelos atos ignorantes. Minha filha tem um livrinho, que é um dos mais vendidos mundo afora, que se chama Tudo bem ser diferente. Não, Nina. Ainda não está tudo bem e pelo jeito nunca vai estar.”
Ações – A luta cotidiana por respeito e reconhecimento
Tamanho é documento, por Tamar Matsafi
*Respeite o Nanismo – A seguir, trecho de texto de Carla Abreu, anã. Li no face Respeito o Nanismo, que tem o objetivo de divulgar informações, trocar experiências e ampliar conhecimentos sobre o Nanismo na Região Sul do Brasil (https://www.facebook.com/respeiteonanismo/).
“Por vezes, a sociedade através de muita violência quer dizer a nós que não merecemos aquele lugar, que não merecemos os nossos sonhos, que o sonho que realizamos e os outros tantos que nós queremos realizar não pertencem a nós. Muitas vezes, ela nos violenta dizendo que não podemos ou não temos habilidade de sermos quem quisermos ser, pelo simples fato de, na sua esquizofrenia, não aceitar que a diversidade é algo intrínseco à natureza.”
*Grandes Cidadãos – Os desafios das pessoas com nanismo. Série que mostra com naturalidade o cotidiano dos anões em 4 episódios: Nanismo, Obstáculos, Família e Preconceito. Canal Rede Brasil no youtube.
Tamanho é documento (2), por Tamar Matsafi
*Queria ser Penélope Cruz em tamanho mini – Verônica Ned, atriz e cantora, filha caçula do cantor Nelson Ned (1947-2014), anã como ele e os outros dois irmãos. Verônica produz, em parceria com a plataforma Benfeitoria, a websérie Fale com Veca, inspirada no filme Fale com Ela, de Pedro Almodóvar. Em 10 capítulos, a série conta histórias sobre os traumas da família, preconceito e sonhos da atriz que quer fazer um filme com o cineasta espanhol. https://www.facebook.com/falecomveca/
“Para a gente tudo é alto, grande, duro, pesado, longo, comprido, distaaaaaante pra caramba”, declarou ela em um vídeo sobre o projeto. “Mas isso não quer dizer que a gente não vai conseguir chegar lá. Porque a gente é menos”. Verônica contou, no lançamento do projeto em 2015, que já recusou papéis que faziam chacota de sua altura.
“Tipo fazer assistente de palco vestida num biquíni de lantejoula. Não é minha pegada.”
Não é só o preconceito que precisa driblar. No dia a dia, até apertar o botão do elevador é um desafio físico a ser superado, afirmou. “Tirar dinheiro no caixa também não é fácil. Para isso, tenho banquinho no carro. E também uso uma almofadinha (para sentar no banco do automóvel) e um patinete, se for distante, umas cinco quadras.”